Retorno às aulas
Por: Cristina Vergnano
Se não fosse a pandemia… Palavra gozada, essa. Lembra uma batida, pan, pan, pan, ou quase a chacoalhada de um pandeiro, seguida da lamúria de um gato manhoso, que mia, mia e mia no ouvido da gente. Não é tão ruim quanto a coisa. Ao contrário, eu a sinto até um pouco macia do meio pro final. Já quarentena me parece opressiva e mais longa. Explode seca duas vezes. Grita com uma gargalhada debochada – qua, qua, qua – e, depois, me dá um tapa na cara ou um teco nas ideias – te, te, te. Além do mais, sai pelo nariz, como se eu já me sentisse, só de falar nela, entupido da tal covid. Tá, pandemia também é fanha, mas eu sinto diferente. Fazer o quê?
Bem, se não fosse a pandemia e a maldita quarentena com isolamento, eu não tinha ficado tanto tempo longe da escola. Daí, o que antes era um aborrecimento, virou desejo e expectativa.
Escola. Argola do brinco da Silvinha, tão linda, tão fresca, tão fluida. Marola das ondas da praia que batem no píer do outro lado da rua. Sacola de frutas que a mãe me pede pra levar pra casa, da loja do seu Juca, após a saída.
Hoje é o dia! O regresso rola roliço como uma bola rua abaixo, na Ladeira do Escorrega. E me leva, ligeiro, flutuante, faminto de encontros, porque o peito estala de saudades, mesmo da obrigação e do tédio.
Na sala, caras novas e antigas. A professora. A chamada. O Dunga, gozado e atrapalhado. O Patrik, alto, arrogante, áspero. A Catarina, sempre tão séria e tímida. E a Silvinha, sinuosa, serena, sentada ao meu lado como se fosse ontem o dia em que uma centelha faiscou no seu olho.
A matemática se rabiscava no quadro, enquanto a biologia e a química se esqueciam de vírus, máscaras, álcool e só pensavam que a vida voltava para ser vivida.