ENTREVISTA COM DAG BANDEIRA: AUTORA DE TRILHA SONORA
Por: Cristina Vergnano
Dag Bandeira é uma autora carioca, com contos e romances publicados, cuja formação inclui a graduação em Português-Inglês, uma especialização em Língua Inglesa e o mestrado em Linguística Aplicada, Interação e Discurso. Escreveu para a coluna “Nas Entrelinhas da Escrita”, do Jornal Sobrecapa Literal online, entre 2011 e 2013. Recebeu menção honrosa no Concurso Nacional de Contos Newton Sampaio, em 2008, com o conto “Os mendigos do solar em frente”. No seu Facebook, Dag Bandeira publica resenhas de obras literárias.
Agora em maio, convidei-a para participar deste Web-papo a fim de conversarmos sobre seu último romance, Trilha Sonora, recém-lançado pela Editora Cambucá (2023). Espero que curtam!
Tecendo o verbo: Oi, Dag. Estou muito feliz por você ter aceitado o convite e poder compartilhar conosco um pouco sobre seu processo criativo e o novo romance.
A capa de Trilha Sonora é bem instigante e nostálgica. A ideia de reproduzir um disco de vinil nos transporta para a época em que a história se desenrola. Mas fiquei com uma curiosidade. Os nomes dos capítulos, que aparecem como títulos de canções na etiqueta do “bolachão”, foram inspirados em músicas existentes, ou são apenas uma sugestão? Porque bem poderiam ter sido, dadas as escolhas que você fez. Como você os definiu?
Dag: São só os nomes dos capítulos do romance. Em conversa com Rosane Nunes, minha editora, me foi sugerido colocar o nome dos capítulos como se realmente fossem os títulos das faixas musicais ali encontradas.
Tecendo o verbo: A trama se desenvolve em torno de uma gravadora e das pessoas que ali trabalham. É feita uma referência, na orelha escrita por Armando Pittigliani, à PolyGram e à sua experiência trabalhando por lá. Já se disse que um autor pode colher elementos de sua vivência como mote para criar sua ficção. Guardadas as devidas proporções, como esse seu trabalho serviu-lhe de mote? Que cuidados você teve de tomar para fugir à tentação de retratar, quase como numa crônica, pessoas e eventos? Pergunto isso, pensando que, com grande frequência, a vida real não funcionaria bem como obra ficcional, por mais fantástica que seja.
Dag: “Fale de sua aldeia e estará falando do mundo” (Leon Tolstoi), ou seja, conhecia bem o dia a dia do trabalho naquela gravadora específica, dessa forma, me senti segura em fazer os personagens transitarem naquele ambiente de trabalho. A trama da história e os conflitos criados entre as figuras dramáticas são totalmente ficcionais. Quanto a alguns eventos, como a ida dos artistas aos programas de rádio e TV, como a perseguição de muitos dos nossos intérpretes e criadores da música brasileira pelos agentes do estado de exceção realmente aconteciam naquela época. Nada mais normal do que esses fatos aparecerem no contexto ficcional.
Tecendo o verbo: Você desenvolveu sua trama sobre um momento bastante difícil de nossa história. Imagino que não o tenha vivido diretamente. Então, como foi o processo de pesquisa para compor seu enredo e lhe dar a verossimilhança que conseguiu alcançar?
Dag: À época, presenciava a cautela, os medos no modo de agir e sobre o que falar entre os artistas. Mas os detalhes sórdidos de torturas e perseguições vieram a partir de filmes assistidos posteriormente, leituras de livros sobre o tema e pesquisa nos documentos disponibilizados pela Internet do movimento Tortura Nunca Mais.
Tecendo o verbo: Outra temática sensível que você aborda, além da ditadura, é a violência contra a mulher. O tema é trabalhado de forma intensa e toca bastante. Mas fiquei pensando, remetendo às minhas lembranças de adolescente dos anos 1970, se uma mulher daqueles anos teria avaliado com tanta precisão os diferentes tipos de agressão que sofria. O conceito de agressão psicológica, por exemplo, ou de que ofensas meramente verbais são, de fato, violência e crime, não me pareciam, contudo, tão óbvios então, ao menos, para a maioria das vítimas. Seria esta abordagem uma presença da consciência e da voz do século XXI permeando seu texto? Ou seja, um contraponto entre o ontem e o hoje, para aumentar a reflexão. Como você concebeu essa temática no âmbito do romance?
Dag: Acredito que num contraponto entre o ontem e o hoje como você bem disse. Passou a me incomodar muito nos dias de hoje eu ter sido tão alheia à opressão às mulheres no passado. Não cabe mais não olharmos e denunciarmos os desmandos do patriarcado no mundo. Fui criada num ambiente familiar de muito afeto e, quando adolescente e jovem adulta, sempre estive protegida de agressões mesmo sendo mulher. Havia o exemplo de minha avó e minha mãe, mulheres fortes e independentes financeiramente do sexo masculino, embora muito amadas por seus maridos. Ao escrever o livro, essa conscientização aflorou normalmente e nada mais justo do que repassá-la para meus possíveis leitores jovens.
Tecendo o verbo: A linguagem do romance flui de forma bem natural. Não há excessos na tentativa de retratar um período da história recente. Você escolheu algumas expressões, salpicadas aqui e ali, que deram sabor à narrativa e ajudaram a colocar o leitor naquela época. Sua formação em Letras e o mestrado em Linguística Aplicada e Discurso, de alguma forma, contribuíram para o processo de construção desse contexto linguístico? Como foi retomar uma linguagem carioca dos anos 1970?
Dag: Fiz pesquisa, basicamente sobre as gírias da época, para dar autenticidade aos diálogos. A preocupação com o fazer literário é que moveu o meu texto.
Tecendo o verbo: Pensando na sua obra literária até o momento, como você comentaria a sua trajetória e que contrapontos faria entre este romance e os textos anteriores?
Dag: Acho que a cada criação o texto se aperfeiçoa. Frequento oficinas literárias, leio muito (literatura brasileira principalmente) e escrevo minirresenhas dos livros que leio para divulgar nossa literatura, motivar a leitura e exercitar a concisão na escrita. Dessa forma, a minha escrita tende a melhorar sempre.
Tecendo o verbo: Sabemos que ser escritor no Brasil não é uma tarefa fácil. Conte-nos um pouco desse seu processo, não somente em termos artísticos e criativos, mas no que se refere à questão comercial: produção, distribuição, divulgação. Que dificuldades você enfrenta e que fatores colaboram para facilitar ou viabilizar o processo como um todo?
Dag: A questão comercial (produção, distribuição, divulgação) para os escritores iniciantes, é um processo penoso. O autor tem que usar das ferramentas disponíveis hoje (Facebook, Instagram, entre outras) para divulgar seu próprio trabalho, participar de concursos literários e ser premiado e aparecer na mídia a ponto de interessar as grandes editoras e distribuidoras pelo seu livro. Há editoras pequenas que trabalham com autores pouco divulgados ou conhecidos, mas que dão muito apoio a seus escritores, como deixando os livros em livrarias conhecidas, por exemplo. Isso ajuda um pouco. Minha editora, a Cambucá, faz isso e sempre procura eventos e feiras para apresentar seus autores e suas obras ao público leitor.
Tecendo o verbo: Para os leitores e leitoras que acompanham esta entrevista, muitos e muitas autores também, o que você diria sobre os aspectos vitais na formação, desenvolvimento e trabalho de um escritor?
Dag: Nunca se afastar da leitura dos grandes clássicos mesclada à leitura de autores contemporâneos, nacionais ou estrangeiros.
Tecendo o verbo: Para concluirmos, há algo mais sobre o que você gostaria de falar e não foi contemplado nas perguntas anteriores?
Dag: Só tenho a agradecer o convite para conversar com o Tecendo o Verbo e por sua leitura atenta ao meu livro. Quero também elogiar o conteúdo deste blog.
Tecendo o verbo: Para mim foi um prazer tê-la aqui no ToV. Agradeço seu comentário sobre meu blog. Assim como você, acredito que a prática, a leitura e o estudo nos aproximam, um passo de cada vez, da desejada “perfeição” (guardando as devidas proporções, claro). Agradeço, Dag, a gentileza de ter aceitado o convite e desejo um grande sucesso para seu livro e sua carreira.
Nota: Se vocês gostaram da entrevista e querem conhecer mais sobre Dag Bandeira e sua obra, podem entrar em contato pelo seu Instagram: dag.bandeira ou pelo Facebook: Dag Bandeira. O livro Trilha sonora encontra-se à venda no site da Editora Cambucá, na Livraria da Travessa, em plataformas digitais ou com a própria autora.