Gravura em dia de chuva
Por: Cristina Vergnano
A tarde está cinzenta e encharcada. Ainda não é hora do rush, mas, numa avenida central da cidade, faróis, lanternas e buzinas já se fundem, clamando por espaço. Nas calçadas, um mar de ternos e pastas se agita em ondas entrechocadas de guarda-chuvas abertos.
Num primeiro plano, uma mulher de tailleur. Ela desvia, elegante, de outra que tenta equilibrar o enorme guarda-chuva com uma das mãos, enquanto sua esquerda puxa uma criança desejosa alcançar algo imaginário no sentido oposto.
Adiante, à direita, a enorme boca escura e gotejante do metrô aguarda a massa ondulante que ruma para si. Abafamento, chuva, fumaça, luzes e ruído chicoteiam o avanço dos transeuntes em sua direção. E todos parecem ávidos para lhe saciar a fome.
Nota da autora: Este miniconto (ou mini crônica, como até prefiro) foi inspirado numa litografia de Solange Vergnano e composto como mote para uma atividade criativa do Grupo Traçando. Também foi apresentado na Oficina de Escrita Criativa da segunda Edição do Prêmio Rio de Contos, tendo, nessa ocasião, sido desdobrado em outro texto breve, com diferente foco narrativo.