Ausência
Por: Cristina Vergnano
Despertei inquieta. Parei por um momento, sentada na borda da cama, tentando achar o motivo. Minha memória parecia estar falhando. Algo me incomodava – quem sabe, o sonho da noite anterior –, mas nem todo o meu esforço pôde dar consistência ao que me sufocava.
Comecei a pensar: a lembrança perdida poderia ser um episódio traumático e, neste caso, melhor deixá-la ali, no passado. Ainda assim, era impossível ignorar. Algo crescia em minhas entranhas, uma certa nostalgia, um não sei quê pedindo choro e recolhimento.
De que sentia tanta saudade? Que vazio precisava ser preenchido, trazendo essa mágoa com um misto de sentimentos antagônicos? O que me pesava no peito a ponto de experimentar remorso, como se devesse ter agido diferente em relação a um acontecimento ou a uma pessoa, embora não soubesse quem, nem como ou por quê. Qual o motivo de tudo isso justo agora?
Levantei-me, tropecei aqui e acolá, embriagada por um mal difuso. Na cozinha, o cheio do café e uma melodia triste no celular começaram a dar forma àquela angústia. A evocação, por fim, materializou o objeto daquela lacuna. Olhando a imagem, refletida no vidro da janela, da mulher de cabelos brancos, sulcada pela vida, quase pude tocar o rosto jovem, sorridente e querido, cochichando ao meu ouvido.
Seria nosso aniversário. Fazia já vinte anos… As lágrimas, então, rolaram até umedecer a face e pingar sobre a bancada da pia, devolvendo-me a recordação e refrescando minha dor.