Parabéns, meu Rio!
Por: Cristina Vergnano
De vez em quando, nesta época do ano, algum veículo de comunicação nos recorda que muitas pessoas, inclusive cariocas, nem se dão conta de que primeiro de março é o dia do aniversário do Rio de Janeiro. Hoje, nossa cidade completa exatos 459 anos. O motivo de tal lapso se deve, provavelmente, a que os aniversários dos municípios costumam ser feriados. No caso da Cidade Maravilhosa, contudo, este ocorre em 20 de janeiro, dia do seu padroeiro, São Sebastião. Não há como, segundo a legislação brasileira, manter o feriado em ambas as datas. Sendo assim, só nos resta encontrar formas de celebrar, mesmo sem termos o dia de descanso. Gastemos, então, um tempinho para lembrar e comemorar.
Não sabia, até começar a escrever, se houve, como era praxe, o tradicional bolo na rua da Carioca. Por isso, dei uma pesquisada e descobri que a festa aconteceu, sim, mas no Cristo Redentor. Além do parabéns, houve uma missa de ação de graças celebrada pelo cardeal-arcebispo Dom Orani. E, de qualquer maneira, embora em outro local, a Sociedade Amigos da Rua da Carioca e Adjacências também participou, com a entrega de troféus “O mais carioca de todos”.
O título de Cidade Maravilhosa é, por vezes, polêmico. Por um lado, fazendo eco com o ufanismo de seu hino (aquele que ressalta seu cognome já no título e fecha os bailes de carnaval), turistas se encantam com suas belezas naturais, carnaval, festividade de ano novo, alegria e amabilidade do povo. Por outro, não é possível ignorar as dificuldades inerentes a uma grande metrópole, assolada por problemas de desigualdade social, limitações na infraestrutura e criminalidade. Somos um espaço de contrastes.
Qualquer um com algum senso crítico saberá reconhecer nossas deficiências e lamentá-las. Quando ao nosso alcance, lutamos para minimizá-las. No entanto, ter em mente as carências não significa rejeitar o que há de positivo na nossa terra. Ao contrário, pode ser um incentivo à luta por melhorias.
Uma colega fez uma postagem, recentemente, lembrando que temos a tendência de colocar sob holofotes as más notícias. Parece que tal “pessimismo” de fato impera. Ou, dito de outra forma, tragédias vendem mais. Por diversas vezes, ponderei que a maldade, o crime e a corrupção são grandes, porém, creio eu, não absolutos ou majoritários. Apenas aparecem com maior destaque e sombreiam o lado bom das coisas e das pessoas. Será desta forma com São Sebastião do Rio de Janeiro (este, a propósito, o nome completo da cidade a qual chamamos carinhosa e intimamente só de “Rio”). Se abrirmos os olhos do sonho, da arte, do coração, conseguiremos enxergar as praias, as montanhas, a variada flora e fauna, a luminosidade, a música, a literatura, a criatividade, a capacidade de driblar situações adversas e se reinventar, os centros de educação e de pesquisa. Somos plurais e, nesta maravilha, coexistem o belo e o problemático.
A cidade nasceu como um projeto de proteção contra invasores estrangeiros, naquele momento específico do século XVI, os franceses alojados numa ilha na baía de Guanabara. Foi capital do país no período colonial, substituindo Salvador, no vice-reinado, no império e na república. Após a criação de Brasília, tornou-se cidade-estado: Rio de Janeiro, capital da Guanabara. Por fim, após a fusão, passou a capital do estado do Rio de Janeiro. Isso lhe dá um caráter curioso, pois em diferentes gerações de uma determinada família, os nascidos num mesmo território, se identificam com distintas naturalidades. Alguém pode ter uma bisavó nascida na capital do império, uma avó no distrito federal, uma mãe na Guanabara e ser filha da capital do estado fluminense. Todas cariocas, todas do mesmo solo, compartilhando raízes comuns e realidades em constante mutação.
Se a metrópole nos engole e angustia com suas mazelas, fazendo-nos desejar lugares mais amenos e sossegados, também nos enfeitiça com certo fascínio, nos prende a ela e nos dá orgulho de sermos cariocas. Por isso, Rio, cantamos parabéns pra você!
Belíssima e merecida homenagem à nossa querida cidade do Rio de Janeiro! Orgulhosamente, cariocas, e só nós podemos falar mal de nossa metrópole purgatório da beleza e do caos.
Viva nosso aniversariante e parabéns pela reflexão, prezada Cristina Vergnano!
🙂
Obrigada pelo comentário e pelo apoio à crônica. De fato, nós, cariocas de nascimento, ou os que se deixaram adotar pelo Rio, conseguimos sentir e amar a cidade, tendo claras suas muitas contradições e seus gigantescos problemas. É até algo curioso:um lugar que nos deixa incomodados, em certa medida, às vezes, com vontade de partir, mas, ao mesmo tempo, nos acolhe e dá orgulho. Nisso reside, creio eu, a justeza do epíteto. Há maravilha no caos. Grande abraço.