Omedetō, Nakahara-san! Kanpai!
Por: Cristina Vergnano
Calma, pessoal! Este artigo não está escrito em japonês! …E eu nem teria condições de fazê-lo, por mais que o desejasse. Quanto ao título, logo saberão o que significa e por que o escolhi. Verão que faz todo o sentido.
Para começar a entender, precisamos retornar no tempo cerca de 16 anos… Naquela época, surgiu um pequeno restaurante japonês, quase na esquina da minha rua, aqui na Tijuca. Foi lá que me apresentaram Eduardo Nakahara, o Dudu, chefe do sushi bar, um paulista descendente de japoneses. Esse profissional, magro, moreno, tímido e reservado, sabe muito bem do seu ofício. Não é à toa que, anos mais tarde, foi considerado o melhor sushiman do Brasil, indo representar nosso país num concurso no Japão. E, as suas fantásticas criações povoaram esses 16 anos do restaurante, fazendo a delícia de todos nós que o frequentávamos.
Infelizmente, nada na vida é eterno. No final de março deste ano, já em plena pandemia, o restaurante fechou suas portas. Não faliu, não! Nem desistiram dele! Apenas seus donos concluíram que era hora de alçar voos mais altos e optaram por deixar a zona norte e transferir-se para um bairro da zona sul. Como conserva a mesma equipe, sua qualidade com certeza será mantida. Lamentavelmente, a nova sede não deverá a fazer parte da minha história… E, como sou sentimental, sinto-o muitíssimo. Mas (e eu não sou uma pessoa que lide super bem com mudanças, para minha tristeza) aprender a vivenciar o novo faz parte do crescimento pessoal e social. Sendo assim, vamos em frente!
Pois bem… No início do mês de abril de 2020, em meio a toda a tensão da pandemia, as mortes, as dificuldades financeiras e sociais, os embates políticos, a quarentena e os efeitos gerais do confinamento, recebi uma bela notícia por WhatsApp. “Nakahara Sushi Delivery” começaria o serviço de entregas para a região da Grande Tijuca!
Claro que reconheci o nome. Trata-se do mesmo chefe do restaurante que citei anteriormente. Mas, ainda que não o tivesse lembrado, recebi, com prazer, outra mensagem mais pessoal (no sentido de não ser apenas um “newsletter”), informando sobre a proposta. Com a saída do restaurante japonês daqui e considerando que as restrições da quarentena retardaram sua abertura na zona sul, um serviço exclusivamente de delivery passou a funcionar para a Grande Tijuca, só à noite, com uma opção de cardápio muito bem cuidada, a partir de 31 de março de 2020.
Bem… o delivery tem lá suas desvantagens… A maior delas, em minha opinião, é perdermos os bate-papos com o Dudu, nos quais aprendemos tantas coisas interessantes sobre a cultura e a gastronomia japonesas. Isso, enquanto apreciávamos suas deliciosas criações. As conversas não eram longas, confesso. Afinal, ele é uma pessoa, como eu disse, reservada e tinha muito trabalho para ficar gastando tempo de prosa. Ainda assim, foram muito boas e sentirei saudades…
Seja como for, a assinatura de Eduardo Nakahara está ali, no novo serviço! Na singeleza elegante da logomarca, na seleção variada e muito boa dos peixes e, como pude constatar, na excelência da apresentação e do sabor do que chega à minha casa cada vez que faço um pedido… Em tudo se percebe a competência e a discrição desse profissional. Ele, que foi premiado, como já salientei, o melhor sushiman do Brasil. Por isso escolhi para o título: “omedetō”, que quer dizer parabéns, congratulações, e “kanpai”, um brinde à sua iniciativa.
Tenho ouvido muito falar nas grandes dificuldades pelas quais passará o país com a crise econômica advinda das restrições de contato social. Nem estou questionando (ou duvidando) que uma epidemia desta magnitude traz e trará, não só para o Brasil, mas para o mundo (conectados como estamos), muita privação. A questão é que fico pensando (como leiga, já eu não sou economista, mas que sabe pensar) em saídas para a crise que não implicassem a banalização de perdas de vida. Nunca vi, por exemplo, um boom tão acentuado de entregas e comércio a distância, ou de indústrias e pessoas produzindo artefatos que agora são imprescindíveis (como as máscaras ou o álcool gel) fora de sua prática habitual. Acho que esta pandemia e as possibilidades das tecnologias da informação e comunicação (as, TICs) estão abrindo portas e fomentando reinvenções nas relações, tanto pessoais, quanto profissionais.
Sei que há pessoas que precisam continuar trabalhando para que a vida funcione nesses tempos de exceção: profissionais de saúde, de segurança pública, bombeiros, comerciários das áreas de alimentação e remédios, entregadores, motoristas, caminhoneiros, agricultores, criadores etc… A esses, nosso reconhecimento e agradecimento, além do desejo de que sejam cuidados e protegidos, posto que se expõem pelo bem comum. Sei, também, que há outros tantos que acabaram ficando sem seus trabalhos (nem sempre empregos regulares, vejam bem!), para quem a situação está muito complicada. Mas, ainda nesses casos, imagino que, se pensarmos socialmente em medidas alternativas, seja possível protegê-los e, também, aos fragilizados que sofreriam com a retomada da vida “normal”.
E o que isso tem a ver com o Nakahara sushi Delivery?!? Tem, que este sushiman não só pensou numa forma de atender as pessoas que ficaram sem o restaurante japonês de referência (um dos melhores do Rio) que mudou de bairro… Propôs uma alternativa criativa para lidar com a crise. De forma bem pensada, começando com cautela e planejamento, está usando seu talento, o trabalho coordenado de um pequeno grupo de pessoas e a tendência nova do relacionamento a distância (aqui marcada pelas entregas) para vencer as dificuldades momentâneas. E não só para este contexto! Pelo que me informaram, é um projeto de longa duração, um investimento no futuro.
Eduardo Nakahara e sua equipe (prioritariamente, ao que parece, um negócio familiar) não estão sozinhos. Tive notícias de diferentes iniciativas equivalentes. Uma refugiada que está ampliando suas comidas, das árabes para outros tipos, e fazendo entregas. Um grupo que faz intermediação entre consumidores e produtores orgânicos, ampliando sua forma de atender. Um casal que teve que fechar seu bar, mas optou por preparar refeições e entregar. Pessoas que, em casa, pegaram suas máquinas de costura e estão produzindo máscaras. Escolas que estão adotando plataformas de ensino a distância ou remoto e retomaram o contato com seus estudantes. Laboratórios de análises clínicas investindo na coleta domiciliar. Instituições religiosas mantendo suas atividades e celebrações pelos meios de comunicação, dando suporte aos seus fiéis. Médicos e psicólogos atendendo por telefone e Skype. Empresas de serviços oferecendo futuros descontos, parcelamentos e vantagens em troca de adiantamentos, para pagar seus funcionários, e recebendo o suporte de seus clientes. Artistas fazendo apresentações por YouTube. Empresas disponibilizando cursos on-line com descontos ou gratuitos para ajudar a passarmos pelo confinamento. Defesas de teses e dissertações de pós-graduação ocorrendo por meio de videoconferências e em salas virtuais. Gente que, solidariamente, começa a preparar refeições para distribuir entre pessoas sem teto ou dissemina propostas de contribuições voluntárias a entidades e grupos fragilizados (estas, ações gratuitas, claro)… São diversas as propostas e soluções!!!
Pois é! Os Estados Unidos sobreviveram à queda da bolsa de 1929. O Japão arrasado resistiu a Hiroshima e Nagasaki. A Alemanha se reergueu no pós-guerra, derrubando as feridas do nazismo. A Coreia do Sul tem-se superado. Muitas nações que sofreram catástrofes ambientais, naturais, econômicas, pestes e guerras conseguiram, com solidariedade, trabalho e educação, dar a volta por cima. Somos criativos e mais fortes do que as adversidades quando estamos unidos e imbuídos do bem comum. Por isso é tão importante reconhecer e parabenizar as iniciativas que procuram superar as circunstâncias, sem prejudicar os demais.
Há muitos que merecem um brinde. No momento, eu os homenageio na pessoa de Nakahara-san, que está usando sua criatividade e conhecimentos para inovar. Aproveito, hoje, o aniversário de 3 meses de seu empreendimento, em franca expansão e sucesso, já atendendo também à zona sul, para isso. Omedetō! E muito obrigada (arigatō)!