Entrevista com nosso imortal, Rodrigo Mansor
Por: Cristina Vergnano
A partir do dia 6 de dezembro de 2022, o Grupo Traçando terá o prazer de dizer que possui em seu meio um imortal. Isso mesmo! Rodrigo Ribeiro Mansor ocupará a cadeira 01 da Academia Muriaeense de Letras.
A AMLE foi fundada num dia 06 de dezembro há dez anos com o objetivo de promover e difundir conhecimento literário, pedagógico e científico, dando destaque à contribuição de expoentes locais e regionais. Possui trinta cadeiras ocupadas por artistas plásticos, músicos, escritores, historiadores, nascidos ou radicados em Muriaé, com uma trajetória pessoal e/ou profissional promotora dessa valorização da cultura. Seus trinta acadêmicos fundadores indicaram, na época, um nome da Literatura Brasileira como patrono de sua cadeira, sendo Paulo Fraga, escritor e ex-prefeito da cidade, falecido em 2010, escolhido como patrono da Academia.
O modelo da AMLE, cujo lema é “Ars una, species mille”, segue o da Academia Brasileira de Letras, na qual se inspirou. Entre outros aspectos, isso significa uma agenda anual e reuniões periódicas, além da abertura de editais para preenchimento das cadeiras vagas. Os novos imortais são eleitos, por maioria simples, pelo voto secreto dos membros titulares.
Tenho, então, o prazer de conversar com Rodrigo e trazer para vocês, leitoras e leitores do ToV, um pouco sobre sua trajetória e sobre a academia em si.
Cristina: Rodrigo, nós do Traçando recebemos com muita alegria a notícia de sua eleição. Como foi o processo, desde a abertura do edital até a notícia do resultado? O que você acha que pesou, no seu caso específico, na decisão?
Rodrigo: Primeiramente, agradeço pelas felicitações e compartilho da alegria. Tenho comemorado cada vitória, publicação, destaque e menções que os membros do nosso grupo têm recebido. É bom ver que nossos encontros estão dando frutos.
Quanto ao processo de escolha, acho que é o terceiro ou quarto para o qual me inscrevo. Nas outras oportunidades, alguns nomes de destaque em Muriaé, principalmente pelo engajamento nos temas das artes e literatura, venceram os escrutínios (e têm sido muito atuantes). Por isso, eu, por ser um pouco mais tímido e recluso, inicialmente pensei em não me candidatar à vaga, porém, encontrei, por acaso, com duas acadêmicas da AMLE na mesma semana em que a concorrência foi aberta e elas me convenceram a realizar minha inscrição.
Creio que a escolha pelo meu nome se deu pela soma das minhas atividades docente, acadêmica e literária. Como escritor, publiquei aqui em Muriaé um livro de poemas – Anjos, flores e poesia, em 2017, e um de contos – Entre o Bem e o Mal, em 2020; já, na área acadêmica, venho produzindo e orientando artigos científicos e monografias sobre Literatura Fantástica e Literatura e Ensino; este último item tem sido foco, também, do meu trabalho em sala de aula – acredito que meu trabalho de incentivo à leitura nas escolas tem sido significativo e, talvez por isso, valorizado.
Cristina: Você é paulistano, não é? O que significa, então, ser agora um cidadão proeminente das Letras de Muriaé? Como se construiu esta sua relação com a cidade que o acolheu?
Rodrigo: Sim. Nasci na capital paulista e lá morei por 17 anos. Ao chegar em Muriaé, meus únicos amigos e conhecidos eram parentes. Foi como estudante de Letras e, posteriormente, como professor de Língua Portuguesa que comecei a ter contatos em Muriaé.
Ainda guardo memórias de São Paulo, afinal, vivi minha infância e o começo da minha juventude lá – inclusive, foi lá no bairro da Brasilândia que eu comecei a escrever. Contudo, meu amadurecimento, pessoal e literário, ocorreu em Muriaé, por isso me sinto muito mais mineiro que paulista. Ter esse reconhecimento em Muriaé me ajuda na percepção da minha própria identidade: sou um muriaeense nascido em São Paulo, um interiorano oriundo da metrópole rsrsrs. Acho isso legal, me permite interpretações da vida como sujeito de dois polos, por assim dizer. Já em relação ao acolhimento, nem há o que dizer, Minas Gerais faz todo brasileiro se sentir em casa!
Cristina: Só um parênteses: quando conheci você, realmente pensei que fosse mineiro, por causa do sotaque. Agora, poderia nos falar um pouco sobre o patrono de sua cadeira?
Rodrigo: Eu vou assumir a cadeira nº 01, que anteriormente era ocupada por Cícero Gomes Ribeiro, que não mora mais em Muriaé. O patrono desta cadeira é o professor e poeta Hélio Lopes, que nasceu em Eugenópolis, uma cidade vizinha de Muriaé. Ele se ordenou frade franciscano em São Paulo e, depois de estudar Teologia em Petrópolis, começou sua atuação docente em um Seminário de Bauru (SP). Nesse período ele publicou muitos poemas religiosos, alguns dos quais foram traduzidos para o inglês e distribuídos aos membros da Ordem Franciscana ao redor do mundo. Após deixar o hábito, foi professor em importantes instituições de ensino, inclusive na USP, onde atuou como professor-assistente de Literatura Brasileira, e na Universidade de Roma. Em Muriaé, o professor Hélio lecionou na Faculdade Santa Marcelina, que é referência na formação de educadores em nossa região. Foi um estudioso muito ativo na área acadêmica, colaborando em diversos periódicos científicos. Além disso, no campo da literatura, escreveu e publicou diversas obras, dentre elas “Introdução ao poema Vila Rica”, que recebeu o Prêmio José Veríssimo da Academia Brasileira de Letras em 1986.
Cristina: Trajetória inspiradora a do seu patrono. Muito interessante conhecer sua história. Que atividades você deverá desempenhar no âmbito da academia?
Rodrigo: A Academia realiza reuniões frequentes, entre outras coisas, para discutir estratégias de implementações de eventos culturais na cidade e na região. Acredito que inicialmente irei colaborar com essas reuniões, farei palestras e divulgarei e implementarei atividades culturais nas escolas, já que é o espaço onde tenho mais envolvimento.
Cristina: Como professor, pesquisador, escritor e pessoa, o que significa tornar-se um imortal? Como crê que essa deferência poderá contribuir, enquanto formador, para os alunos sob sua responsabilidade?
Rodrigo: A ideia de imortalidade é um pouco perturbadora, talvez porque ela me transmite a ideia de cobrança. Ter um nome imortalizado deveria ser sinônimo de grandes feitos e, por enquanto, só tenho contribuições pontuais para a educação, para o meio acadêmico e para a literatura. Em outras palavras, acho que a ideia imortalidade coloca em mim uma pressão para produzir mais e melhor nessas áreas.
Cristina: Acho que talvez possa ser o pontapé inicial para um percurso que já começa brilhante. E quais são seus projetos a curto e médio prazo nesse universo literário?
Rodrigo: ahhh… aí vai uma lista interminável rsrsrs. Adoro criar projetos literários, minha dificuldade é colocá-los em prática. Tenho escritas mais de uma centena de poemas que ainda não decidi como reuni-los, mas gostaria de criar duas ou três coletâneas com estes poemas já escritos; também já escritos tenho cerca de cinco contos que pretendo aprimorar e tentar publicar em coletâneas de concursos. Tenho também algumas novelas curtas que pretendo rever e procurar parcerias para publicação. Além deste material que já está escrito, tenho dois projetos com livros de contos: um infanto-juvenil com histórias de terrir e outro com uma visão mais voltada para minhas percepções dos lugares e pessoas que conheço.
Pretendo, também, intensificar meu trabalho com a pesquisa na área da literatura visando aplicações em sala de aula. Acho que meu maior sonho literário é ter uma sala de aula em que 100% dos alunos leiam por prazer.
Cristina: Grande meta esta sua! Muito trabalho pela frente, sem dúvida.Que conselhos e orientações, você daria aos jovens cujo interesse se volta para a atuação no âmbito da cultura, em especial, das Letras?
Rodrigo: O primeiro conselho que eu sempre dou é que tudo começa pela leitura. Conheço alunos que já falam em escrever ou escrevem em sites como o Wattpad, mas que nunca leram um livro inteiro. O mundo da literatura é fascinante, mas ninguém começa pela escrita. Aliás, a leitura é fundamental não só para o mundo das Letras: eu entendo que uma pessoa que lê mais está muito mais apta para entender o mundo que a rodeia… culturalmente, politicamente… nossas percepções, sobre tudo, só se ampliam com a literatura!
Cristina: Bem, agora, passo a palavra para você, a fim de fazer seus comentários adicionais.
Rodrigo: Ainda estou um pouco surpreso e eufórico com a escolha do meu nome pela AMLE. Já bateu uma síndrome do impostor, já pensei que posso não dar conta, mas, por outro lado, me senti mais empolgado para escrever, porque, de alguma maneira, vejo essa eleição como uma forma de reconhecimento, então, decidi que, em troca, o melhor que eu posso oferecer é continuar produzindo, seja no âmbito literário ou acadêmico, e, acima disso, continuar lecionando, pois, por mais que eu ame a literatura, meu papel principal na sociedade é como professor.
Cristina: Rodrigo, agradeço muito a oportunidade de trocar ideias com você e poder incluir no espaço do Tecendo o verbo uma notícia tão importante para nós.
Rodrigo: Sou eu quem agradece, Cristina. É muito bom poder tratar de um assunto tão agradável a mim, como a literatura, com uma pessoa que entende tanto quanto você, que é pesquisadora e uma incrível escritora. Queria agradecer também a todos nossos colegas traçantes: nossos encontros me ajudam muito a melhorar minha escrita e a pensar em novas possibilidades… meu caderninho de ideias e projetos sempre ganha novos rabiscos quando estamos juntos. Obrigado a todos. No dia da diplomação estarei com cada um de vocês nos meus pensamentos.
Cristina: E nós com você. Mais uma vez, parabéns e sucesso!